"Precisamos ter mais dignidade"

Do padre Edilberto Sena, sobre alguns comentários feitos à nota Mulheres protestam contra Cargill:

Prezado Nuranda, como é bom a gente trocar idéias e aprofundar os conhecimentos. Seu comentário sobre o protesto da Frente em Defesa da Amazônia, parece-me que carece de alguns reparos, se me permite.

1. Radicalismo é coisa boa. É ir à raiz das questões. Todos nós deveríamos ir sempre à raiz das questões e não ficar na superfície. O que parece errado é o extremismo, por que os extremos, além de exagerar, se tocam nas pontas. Aí, os extremistas de um lado e de outro acabam fazendo o mesmo jogo. Veja um extremo: o secretário dizer que ao grupo tinha direito de se manifestar, mas não naquela hora. Como quem diz: "para não aborrecer os generosos doadores da biblioteca".

2. Migalhas da Cargill. Se você raciocinar o quanto esta multinacional estrangeira já lucrou com o transporte de mais de dois milhões de toneladas de soja pelo porto privado dela aqui em Santarém. E que parte desse lucro tem sido feito com a destruição de matas e florestas e agricultura familiar aqui na região, você talvez venha a concordar que uma biblioteca, por mais importante que ela seja para a cidade, é uma migalha para a sociedade. Era isto o que se fazia com os índios, na época da invasão protuguesa na região. Davam espelhinhos e miçanças e os índios carregavam as toras de pau-brasil, riqueza para os invasores. Você poderia dizer: mas os espelhinhos e miçanças alegravam os índios e isso era bom. Você pensa assim?

3. "Criticariam o Bush por doações de computadores". Santa paciência, parente! Aceitar presentes de Bush em troca de quê? Você, por acaso, já estudou na história da "Aliança para o Progresso", que o Mr. Keneddy, um pouco menos truculento que Bush, doava para a América Latina? Sabia que as "ajudas generosas" deles aqui chegaram a ser de dez bilhões de dólares em dez anos. No mesmo período, os lucros de suas empresas aqui chegaram a 20 bilhões de dólares. Sabe o que se chama a isso: presente de grego (sem ofensa ao J Ninos...).

4. Bibliotecas são coisas muito importantes e necessárias, deveríamos ter uma em cada comunidade com escola do muncípio. Mas não em troca de amaciar as mentes da população, para justificar a invasão que foi feita pela multinacional. Ou você não sabia que ela está condenada pela Justiça Federal por crime de instalar um porto privado sem o estudo de impacto ambiental em Santarém?

5. Uma coisa gostaria que a prefeitura esclarecesse a nós todos: a empresa multinacional foi dispensada de algum imposto do município? do Estado? Federal? (além da dispensa da lei Kandir, que já é um esbulho). Quanto a empresa já pagou ao município desde 2003, quando começou a exportar soja pelo seu porto? Se pagou, onde foi empregado esse recurso? Um funcionário da empresa afirmou, algumas semanas atrás, que a empresa já teria pago cerca de 18 milhões de reais de impostos ao município. Foi mesmo? E como foi utilizado esse recurso? Por que a prefeitura não construiu várias bibliotecas no muncípio com esse recurso.

6. Nuranda e Henrique, o protesto da FDA com a faixa é fruto desse tipo de reflexão. Estamos no século 21 e se repetem atitudes do século XVI. Precisamos ter mais dignidade e amor próprio. Somos um povo capaz de construir nosso presente e futuro, sem precisar de pedir favores de quem deve pagar justo pelos lucros que tira daqui desta terra abençoada por Deus. Com todo o respeito do pe. Edilberto.

Comentários

Anônimo disse…
Padre, minha benção, vejo que o Sr. continua com o coração cheio de ódio, a Cargill deu em troca para a comunidade uma biblioteca, e o Greenpeace deu o quê?
Anônimo disse…
Pe. Edilberto,

Perdoe o anônimo, porque ele realmente não entendeu nada do que vc escreveu.
Não entendeu principalmente que a disputa aqui não se trata de Cargill contra Greenpece. A Cargill é um agente externo que veio aqui prometer desenvolvimento as custas de um alto impacto ambiental com baixo retorno social para a gente local. E o Greenpeace é outro agente externo que veio aqui abrir os olhos e trazer um problema sério à tona, assim como faz em todas as partes do mundo onde atua.

Como bem fala o Anônimo, "a Cargill deu em troca uma biblioteca". Em troca de que? Da destruição da floresta, da crise social e violência no campo instaurada após sua chegada em nossa região?

Anônimo, saia do anonimato e se for Santareno, tenha vergonha de deixar que sua cidade se venda tão barato!
Anônimo disse…
Congratulações Celestiais ao padre que é a luz pra muitos olhos de santarenos deslumbrados com o ganho fácil, embora eles ainda queiram fazer o papel de pior cego.
Vi a tal bliblioteca quando aí estive, senti um misto de náusea e revolta por um povo que se diz tão bairrista ter se prostituido a esse ponto.
Parabéns colega Edilberto, que Deus continue lhe abençoando com muita proteção!!!
Anônimo disse…
Sempre grato a Deus por ter colocado padre Edilberto em nossa terrinha.
Aproveite sua sapiência e senso crítico pra dar uma passeada na questão do tão falado "centro de Hemodiálise" do "segundo irmão". Sei que o senhor congrega da ideoliga petista como eu, mas é uma caso de extrema necessidade falar sobre o circo que eles montaram a despeito dos serviços de Nefrologia. Olhe com seus olhos de cristão esclarecido e veja se não é tão grave ou mais que a análise das migalhas da Cargill
Anônimo disse…
Caro Pe. Edilberto, desculpe a demora para a tréplica, ando ocupado, existe vida além do Blog.
Vamos ponto a ponto.

1 - Discordo do Sr. em relação ao lado bom do radicalismo. Concordo que devemos buscar sempre as raizes das questões e nada melhor que isso que o tradicional e consagrado uso do método científico onde a lógica e a razão tendem a eliminar variáveis inconsistentes como a paixão e a fé. Creio que sr. é testemunha de que venho defendendo a RAZÃO neste debate todo ha algum tempo. Ir à raiz das questões é aprofundamento e não radicalismo. é consenso popular que "O radicalismo emburrece" pois o termo pode ser descrito por "Comportamento ou opinião inflexível; extremismo" segundo o Michaelis. Quem sou eu pra discordar de um dicionário? Resumindo, seu primeiro ponto da réplica ficou dúbio e contraditório pois radicalismo é sim extremismo.

2/5 - tentarei condensar os itens 2 e 5 aqui pra economizar o verbo. Lógico que não sou ingenuo de achar que a doação de uma biblioteca é uma boa ação filantrópica pura e simples. Lógico que existe um compenente de marketing e publicidade envolvidos, ENTRETANTO, como o Sr. mesmo citou, esta empresa teve lucro e, pelo que sei, "neste país" como costuma dizer o "noço guia", uma grande parte do lucro deve ser revertido para o estado na forma de impostos. Não tenho dados pra calcular quanto foi o lucro e tambem nao sei quanto foi pago de imposto (sabe-se lá que tipo de consessões foram dadas na área fiscal/tributária para essa empresa). Pergunto: quantos empresários santarenos (que também lucraram e provavelmente tambem pagaram impostos) doaram um lápis ou um caderno ao erário?
Quantos madeireiros e pecuaristas fizeram uma doação voltada a educação no nosso município? Creio que estes empresários também lucraram às custas de todos os passivos demonstrados pelo Sr. Ou seja, destruiram e nem uma migalha deram... Toda essa discussão é ao meu ver, reafirmo, uma cegueira ideológica pois em uma cidade onde as esferas governamentais são completamente ausentes (os tais impostos pagos com o lucro seja-lá-com-que-negócio não retorna para a sociedade na forma de benefícios para a melhoria da qualidade de vida e bem estar) Qualquer doação é bem vinda. Santarém recebe Migalhas da prefeitura, do governo do estado e do federal também, incluisive o Sr. ja criticou exatamente isso em uma coluna anterior (aumentou a receita na região... e daí?).
Pra onde foram os 18 milhoes de impostos citados?
A culpa é da empresa ou do estado regido pelo partido que o sr. apoia?
Quanto aos índios caro Padre, é melhor não relembrar espelhos, miçangas, batizados nem promessas de salvação eterna pois a multinacional que o sr. representa não tem histórico favorável nem aqui nem em canto nenhum. outro ítem:

3 - Pois bem, repito, em um lugar onde o estado é ausente, onde a elite não busca o bem estar coletivo, onde a miséria impera que mal teria receber doações de Sadam hussein, Bush ou Fidel Castro? Não sei se o Sr. Sabe mas o Colégio Dom Amando fazia parte de planos americanos na região, nem por isso foi uma má idéia implanta-lo aqui. Se os 10 bi de doações tivessem sido usados de maneira eficiente (sem contar os impostos dos 20 bi de lucro), hoje não precisariamos receber nada, nem da cargill, nem do greenpeace e muito menos de déspotas e tiranos. Porém... Enquanto houver uma mínima chance de proporcionar aos menos favorecidos uma oportunidade de mudança e melhoria do seu status miserável, não tenho preconceito de nenhuma doação.

4 - Ainda bem que o sr. concorda que bibliotecas são itens extremamente importantes e necessários. Mas dizer que uma doação é um "amaciador" de mentes é afirmar que hoje, em 2006, o povo santareno é igualzinho aos índios que tinham prazer em receber espelhos e miçangas em troca de alguns navios de madeira. Não creio que o Sr. julga assim a maioria da população. A propósito, na nossa democracia, a tal invasão foi feita sob a concordâcia dos representantes do povo... repito, numa democracia o povo tem os governantes que merece!

6 - Caro Pe. Edilberto, as atitudes do século XVI se repetem por estarmos mais perto deste período do que do atual. Nossa cidade é uma cidade do século XVII/XVIII. Somos colônia, exportamos matérias primas brutas, nao temos esgoto, nao temos nem água nas torneiras mesmo estando diante do maior rio do mundo, temos lixo e urubus, somos incapazes de resolver nossos problemas sem recorrer à "metrópole", por acaso pousam aqui aviões e muito recentemente temos energia elétrica confiável.
Não acho que somos capazes de ditar e construir nosso futuro com as próprias pernas. não temos tecnologia/ciencia, nao temos poder político e não temos poder economico.

O protesto é válido como demonstração de insatisfação, entretanto questiono a eficácia do mesmo e repudio o fato de criticarem uma doação para a unica alternativa realmente eficiente de mudança e de tomada de rédeas da nossa região, a educação.

Repito o convite a uma concorrência positiva pra cidade:

Gostaria que o Greenpeace patrocinasse um museu ou outras bibliotecas pela cidade. Não quero saber de onde vem ou quem mandou o que importa é que a cidade ganhará e não o grupo ideológico que eu defendo.

Um abraço