Celson Lima (*)
COSTUMO folhear o estadao.com todos os dias. E também o publico.pt. Os dois exibiam duas notícias sobre o mesmo tema (problemas dos imigrantes), vividas pelas duas comunidades em questão: a brasileira e a portuguesa.
No primeiro caso, o Estadão noticiava que o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF, a dita policia de imigração portuguesa) tinha interrompido um pagode onde estavam umas 500 pessoas, maioria brasileiros, em busca de pessoas em situação irregular.
Saldo da operação: umas tantas pessoas convidadas a se retirarem do país, sendo que algumas delas passaram a noite na prisão. Como nunca tinha visto esse tipo de ação da SEF nos meus muitos anos de residência por essas plagas, chocou-me sobretudo a precisão (pagode é sinônimo de muitos brasileiros!) e o lado agressivo e brutal do evento.
VÁRIOS motivos foram alegados para justificar o fato, incluindo uma suposta briga entre os administradores da área onde se situa o dito restaurante onde acontecia o pagode e os donos do restaurante em questão.
Além das repetidas cenas de violência e pancadaria que às vezes fazem parte do cardápio de um pagode. Alguns dos motivos são aceitáveis, sem duvida. Outros, mais disfarçados, deixam a impressão que existe uma perseguição no ar.
Apenas acrescento a isso o fato de que a novela para se pedir um visto de residência, mesmo tendo tudo legal (como é o meu caso), é algo que beira o dantesco. Os politicos cantam, com dó de peito, que somos países-irmãos e que esses processos são simplificados para os originários do dito país-irmão. Balela da grossa.
NO SEGUNDO caso, o publico noticiava que o governo canadense vai expulsar algumas centenas de portugueses que estão em situação irregular no país. O antigo governo canadense convidou os imigrantes a fazerem um recenseamento, o governo novo mudou o rumo do barco e está utilizando o resultado do processo para expulsar os ilegais.
O maior sindicato da construção civil apontavam que existem, na realidade, cerca de 10 mil imigrantes portugueses em situação irregular no Canadá. E por que o sindicato da construção civil deu essa resposta?
Porque esse (trabalhador para as obras, como dizem por aqui) é um dos perfis clássicos da mão de obra exportada por Portugal, não somente para o Canadá, mas também para os EUA, França, Luxemburgo, para citar os exemplos que conheço. E aqui entra o ponto-chave de toda essa reflexão: o perfil do trabalhador imigrante.
ACONTECE que Portugal recebe muitos imigrantes do Brasil, dos países lusófonos da África, dos países do leste Europeu e muitos deles visam justamente o mercado da construção civil!
Seria irônico, se não fosse triste, perceber que o mesmo país que expulsa um certo tipo de imigrante, tem os seus próprios imigrantes do mesmo perfil, expulsos de um outro país!
A reflexão pode nos levar mais longe: por que os portugueses vão trabalhar na construção civil em outros países e não o fazem no seu próprio país? Ganhos nominais mais importantes? Descrença no própio país? O lado social do sub-emprego, aceito e encarável enquanto imigrante longe dos amigos, mas inaceitável na sua própria terra?
A SITUAÇÃO econômica menos instável no país de destino, o que possibilita fazer umas economias forçadas enquanto se coloca em marcha um plano de retorno a longo prazo?
E por que saem os brasileiros? Talvez aqui consigamos responder mais facilmente: descrença no país, fazer pé de meia lá fora, ou aquela velha idéia de se “viver no primeiro mundo” (uso essa expressão para exprimir o que ouço, às vezes, ainda que eu não concorde com ela. Zeca Baleiro diz “não acredite no primeiro mundo, só acredite no seu próprio mundo, seu verdadeiro mundo é seu proprio mundo...”. Existem coisas BOAS e MÁS em todos os países.)
Todas essas questões podem nos levar a pensar em coisas maiores. O Brasil continua sendo considerado um país do futuro, agora apontado como o gigante do agronegócio, mas parece que o futuro resiste à idéia de virar presente, para nós.
A TAXA de desemprego tem aumentado na Europa. O problema social dos jovens socialmente desenquadrados na França, também filhos de imigrantes que nunca quiseram se tornar franceses, enquanto os filhos nunca conseguiram sê-lo, por conta do estigma estrangeiro sem identidade.
Às vezes é muito complicado entender o mundo das bandeiras, fronteiras e passaportes.
Esse texto não é para causar polêmica nem chorar magoas; é apenas para externar pensamentos de alguém que vive na pele o cenário e embora eu me considere privilegiado em relação a isso tudo, não deixo de perceber o que acontece à minha volta.
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* Santareno, é pesquisador e reside há mais de uma década na França.
Comentários
1 - A facilidade prevista na constituição de ambos os paises pra se retirar um visto de viagem tanto de brasileiros para Portugal mas mais fácil ainda para portugueses pro Brasil, esse privilégio é absurdo e deveria ser extinto, dessa forma acabaria com a facilidade com que criminosos portugueses levam muitas das crianças e meninas de regiões pobres do norte e nordeste brasileiro para se prostituir em Portugal e outros paises da Europa.
2 - A falsa idéia de "país irmão", Portugal nunca foi e não é país irmão do Brasil, os portugueses são segundo um estudo divulgado pela União Européia no ano passado o terceiro país mais racista e xenófobo da Europa, logo atrás da Austria e da Grécia, portanto se esses brasileiros que pensam em imigrar pra Portugal se dessem ao trabalho de fazer uma simples pesquisa na internet, lendo por exemplo jornais ou blogs portugueses, nunca colocariam seus pés naquele país. Mas infelizmente nossa mídia inrresponsável continua insistindo na imagem do português bonzinho e "irmão" e aí quando o brasileiro, que já gastou todas suas economias no processo de imigração, descobre a verdade é tarde demais pois está num país estrangeiro, sem dinheiro e cerca de um povo hostil. Enfim é triste mas espero que um dia o Brasil conheça a verdadeira e única face do povo português.