O Leviatã

por Santino Soares (*)

Como ninguém comentou, é improvável que Jonas tenha sido vomitado pela baleia que morreu nas águas transparentes do rio Tapajós. Também, difícil é conceber que esse pobre animal tenha algo a ver com o personagem do romance de Herman Melville. Moby Dick, que dá nome ao extraordinário cachalote branco que não perdoou o capitão Ahab –este, de pescador virou petisco. Igualmente impossível é acreditar que a solitária baleia seja o Leviatã, figura contundente em um poema da Torá, no livro de Jó.

Melville tinha o entendimento de que o homem não poderia vencer o Leviatã, por isso, a derrota de Ahab. Na Bíblia, Deus pergunta a Jó: “Poderás pescar com anzol o Leviatã? / Ou fisgar-lhe a língua com uma corda? / Podes pôr um anzol em seu nariz? / Ou com um gancho furar-lhe a mandíbula? / Porventura vai fazer-te súplicas? / A ti falará com meiguice? / Fará ele aliança contigo? / Tu o tomarás por servo para sempre? (Jô: 41:1-4)

Thomas Hobbes tomou o personagem do poema bíblico e o transformou em poderosa metáfora sobre os estados nacionais. Em nosso caso, o Leviatã se manifesta, convenhamos, menos pela burocracia do que pela voracidade. Consome, em taxas e impostos, o produto de mais de quatro meses de trabalho anual dos sacrificados cidadãos deste país, e nem sequer assegura a cada um os direitos básicos de cidadania e dá a devida proteção ao meio ambiente. Este ano, segundo projeções, será devastada na Amazônia uma área equivalente a um milhão e 400 mil campos de futebol.

Os cientistas têm afirmado que a ações predatórias sobre a natureza estão alterando gradativamente a ecologia. Está provado, por exemplo, que as torres de iluminação, as bóias de sinalização marítima, entre outros, interferem no sistema de navegação dos pássaros, fazendo com que saiam de suas rotas e sejam levados para lugares distantes de seus tradicionais locais de migração. Se este desequilíbrio, que está sendo observado em todas as regiões do planeta, acontece com as aves, pode atingir a outros seres vivos, dependendo das mudanças que estejam ocorrendo no meio em que vivem.

Diante da constatação da ciência, poderíamos considerar, mesmo sem um estudo conclusivo, que tanto o jacaré gigante que perdido rondou a frente Santarém quanto a baleia que veio parar a mais de mil quilômetros de seu ambiente podem ter sido vítimas das alterações climáticas, resultado do uso excessivo de combustíveis fósseis e das queimadas das florestas.

A presença desses animais fora de seus ambientes naturais parecem episódios isolados, mas devem ser estudados para que se venha conhecer o porquê do inusitado comportamento. Mas não é o bastante! É necessário que a sociedade se engaje na luta pela preservação.

Embora não passe de uma gota d’água na luta contra um oceano de atentados à natureza, mas, se os homens e as mulheres da região, como os de Nínive, atentassem para o que conclama o nosso Jonas, poderíamos ter esperança.

O padre Edilberto Sena é o nosso Jonas, que bem antes da baleia aqui aportar, corajosamente denuncia os atentados praticados pelos imprudentes, inconseqüentes, desumanos, gananciosos, predadores. É uma voz que deve ser ouvida. Escutá-lo, agora, não mais trará de volta à vida a desafortunada baleia Mink, mas será um começo para se evitar o fim das espécies, inclusive a humana.

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* Radialista "santareno", residente em Belém.

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