Serenidade

Opinião do doutor-professor Samuel Lima sobre o post Não quer calar:

Caro Jeso,

Penso que discutir a questão da corrupção nestes termos é perigoso, porque podemos incorrer no equívoco do simplismo. O problema está localizado no DNA do Brasil (que é 77º no ranking mundial da corrupção, segundo dados da ONU). O fato é que hoje se trata de um fenômeno mundial, e como tal está sendo encarado por Estados e organismos multilaterais, sem moralismos e/ou maniqueísmo banais.

Estou lendo as reflexões sobre o caso Renan Calheiros, conferindo as coisas que ele disse, ponderando sobre as razões da Veja (quem será a empreiteira que "esquentou" a denúncia para tirar a Mendes Júnior da disputa dos gordos nacos do PAC?) e, sinceramente, mano velho, poucas vezes vi um homem público expor as "vísceras" à luz do dia, sem pejo.

Se Renan falou a verdade, a revista dos Civita publicou a "barriga" do século. Caso contrário, pela reação de altíssimo risco assumida pelo senador alagoano, ele está fadado ao banimento da vida pública.

Observemos, com serenidade, as cenas dos próximos capítulos. "Inocência" não é um adjetivo auto-aplicável à Casa maior do poder Legislativo brasileiro.

Comentários

Anônimo disse…
Sabe a Ancora? Pois é quem estuda tem que ser cientista livre de Ancoras e amarras para navegar. Mas nem todos são capzes.a Ancora vermelha está sempre lá.É uma pena e um desperdício.Vemos a todo momento "isso" em nossa cidade.Pessoas que, achávamos, uma vez no poder iriam "lutar melhor" por nós mas, estão presas a Ancoras ideológicas, afinal isso lhes paltou durante sua formação e a coragem intelectual ficou no fundo do rio junto com a Ancora. É uma pena Samuca.É como o "ranso" de quem fumava e parou. Ele talvez não sinta mas todos sentem.Tem uns que consseguem sem ser Doutor. Parabéns a estes, o mundo, o povo precisa de vocês.
Ah! não sou do Cipoal, não sou do PSDB e não trabalho para a Veja. É só uma tristesa sobre a falta de simetria entre o crecimento e a Independência.
Anônimo disse…
A presunção da culpa
(Luiz Nassif)

Quando houve a CPI dos Precatórios, sugeri na “Folha” que temas complexos, e de cobertura continuada, deveriam ser acompanhados em uma espécie de sala de situação, com um editor fora do dia-a-dia, planejando a cobertura, juntando as peças para dar foco às reportagens e impedir absurdos de uma cobertura pulverizada entre vários repórteres, tendo em geral fontes viciadas para alimentar as matérias.

Não coloco a mão no fogo pelo senador Renan Calheiros. Mas o conjunto de impropriedades técnicas da cobertura jornalística é grande. A começar pela manchete dos jornais de hoje, de que Renan não tem comprovantes dos repasses feitos à jornalista.

Vamos pensar.

A jornalista linda teve um caso com um senador da República. Do caso, nasceu uma filha. Segue-se um litígio pesado em torno da pensão. A mãe tem profissão, era apresentadora de um telejornal de grande audiência. Portanto não é uma mocinha ingênua, indefesa e sem recursos. Na disputa pela pensão não se constrange em expor ao escândalo sua vida pessoal, a do senador e -- pior – a da própria filha. Daqui a anos a menina será apontada em todos os locais de Brasília como filha de um adultério, por culpa da própria mãe. Pelos dados divulgados, a moça colecionava qualquer nota de hotel, restaurante, para instruir o processo. Isso no período em que ia com o senador para restaurantes e hotéis.

Após o depoimento do senador, antes de ontem, a maioria dos jornais aparece com as perguntas não respondidas: “Porque ele mesmo não dava dinheiro à mulher, em vez de recorrer ao lobista da Mendes Júnior?”.

No depoimento, ficou claro que a relação não era com o “lobista da Mendes Júnior”, mas com um amigo de vinte anos que estava lobista da Mendes Júnior. Pouco importa: em toda matéria o amigo passou a ser tratado como o “lobista da Mendes Júnior”.

Se já estavam em litígio há três anos, com uma moça que pega pesado (conforme se viu), como é que se estranha o fato do senador pagar as despesas em dinheiro vivo e através de terceiros? Consultem os advogados dos jornais sobre essas disputas pesadas em Varas de Família, e indaguem se havia uma lógica jurídica no despiste de Renan.

E se havia a preocupação de não deixar nenhum rastro de que era ele quem estava dando o dinheiro à moça – porque certamente essa informação seria utilizada no processo – qual a lógica de pretender, agora, que ele comprove que pagou? Vai pedir recibo para o amigo que estaria lhe fazendo um favor (supondo que a versão de Renan seja verdadeira)?

A fazenda

Outra confusão monumental é sobre as fazendas que estariam em nome de laranjas. “O Globo” atirou antes, o senador mostrou que uma das fazendas estava em sua declaração de renda pós-2002 (o jornal só tinha a de 2002, ano em que disputou sua última eleição).

Terminou o tiroteio? Que nada. Na mesma edição ouve-se o primo, que era administrador da fazenda dos Calheiros, que fala de uma segunda fazenda, que teria sido colocado em nome dele, sem que ele soubesse, e até hoje não estaria em nome do senador.

Juntando as matérias do “Globo” e da “Folha”, o resultado é uma confusão ampla. Na matéria da “Folha” fica-se sabendo que a fazenda em questão há décadas pertencia à família do tal do primo. Que teria sido adquirida pela fazenda da família de Renan, que está em nome da mãe dele. Que a inclusão do nome do primo pode ter sido um erro do IBAMA.

Estando em nome da mãe dele, sendo anexada à fazenda da mãe dele, porque deveria estar em nome dele?

Tem irregularidade na história? É possível. Mas o leitor, assim como um juiz, tem que se basear nos autos. E os “autos” só têm “baixos” até agora.

Mas de baixos em baixos, vai se demolindo a figura. Cada defesa dele é colocada com “mas, porém, contudo, todavia”. Se responde a uma acusação, vem outra em seguida. Está sendo como foi a cobertura do dossiê Cayman pela “Folha”. A cada dia se tirava uma informação do documento apócrifo. E os acusados é que tinham que sair correndo atrás das respostas.

Se houver irregularidades graves na conduta de Renan, o quadro é pior ainda: mostra a total incapacidade da cobertura em aprofundar as investigações e levantar fatos concretos.

Uma dica a ser investigada (sem pré-julgamentos, por favor). Pelo que li, entendi que a fazenda foi desapropriada por algum órgão público. Coloquem-se os bravos repórteres para investigar dois pontos:

1. O valor da indenização está acima do valor de mercado e do valor econômico das fazendas?

2. Há alguma possibilidade da família Calheiros ter recebido informação privilegiada sobre a desapropriação, e adquirido a fazenda dos primos -- que teriam se sentido ludibriados depois?

Levantem os dados e ouçam o senador.
Anônimo disse…
Ao anônimo,

(a) Não sei a que "poder" você se refere, cabôco. Vivo do meu trabalho, labuto numa instituição privada há oito anos, como docente do ensino superior, e como tal só tenho minha credibilidade como "cacife", esforço, dedicação.

(b) Fiz um apontamento, livre e autônomo, muito preliminar, que o segundo comentarista acrescenta uma consistente visão de um dos mais brilhantes jornalistas em atividade (e crítico de qualidade da mídia), Luís Nassif. Acho que sua inquietação está respondida, meu caro.

(c) O desdém à minha titulação acadêmica, gratuito e pueril, é um gesto que expressa a pequenez da tua alma. Minha carreira acadêmica não está em debate, mas a minha resposta ao questionamento do jornalista Jeso Carneiro sim é passível de qualquer crítica. Faça o debate de idéias, cabôco, sem viagem ao fundo do rio com sua âncora esotérica, não me importa sua cor. De mais a mais, discutir mídia sem levar em conta valores éticos, políticos e ideológicos é um exercício raso e estéril.

Saudações tapajoaras,

Samuca
Anônimo disse…
O caso Calheiros (culpado ou inocente) tem que ser interpretado por diferentes facetas

1) Renan Calheiros é um político do poder. Não é por acaso que ele é presidente do Senado. Foi líder do governo Collor no Congresso, ministro de Fernando Henrique e, agora, comanda o Senado com Lula e sempre esteve do lado do governo, sem se afastar muito da oposição conservadora.
2) A mídia golpista, inconformada com a derrota eleitoral, sempre procura ou cria um fato que pode abrir uma crise e colocar a coalizão governativa em choque.
3) A oposição (PFL, PSDB), parece ter perdido o interesse em destabilizações golpistas, e voltado a trilhar caminhos mais democráticos. Para eles é interessante manter Calheiros vivo porque o senador pode até ser simpático a Lula, mas está longe de ser seu fã, e tem poder suficiente para incomodar quando quiser.
4) Toda a elite partidária encarnada nos grandes partidos (PMDB, PFL, PSDB e PT), não parece disposta a se desfazer do presidente do Senado, e não é difícil entender essa sintonia de legendas, aliadas ou opostas. Nos últimos 17 anos, Calheiros prestou serviços a todas.
5) Por tudo isso Renan Calheiros sofre a canalhice do ataque pessoal da revista Veja, que abre uma frente de destabilização política para tentar tirar o foco de uma investigação republicana que finalmente ataca não só os corruptos (políticos e funcionários públicos), como também os Corruptores (Empreiteiras, Empresas, etc.).
6) Atitudes de Pré-julgamento (tão caras à mídia golpista) soam estranhas nesse panorama político. Principalmente quando as acusações são jorradas e ao mesmo tempo contraditas nos editoriais dos jornalões golpistas.

Petistólogo
Anônimo disse…
Mais uma do Lius Nassif e a Mídia

O governador Jackson Lago é acusado pelos jornalões de ter tido seus bens interditados, suas contas bancárias bloqueadas. Não era verdade, mas não consegue se fazer ouvir.

Com o nome enlameado no país todo, recorre à única maneira de se defender: anúncios pagos nos jornais que não quiserem ouvir a sua versão.

Hoje, “Folha” e “Globo” soltam matérias sobre os anúncios, em tom de denúncia. No meio da matéria, "O Globo" até admite que errou nas informações.

O problema não é o pagamento indevido. É de recebimento indevido.

Por justiça, os jornais deveriam devolver ao Maranhão o dinheiro recebido e corrigir, em matérias, os erros cometidos.
Anônimo disse…
Mestre Jeso,

Reproduzo post de hoje do blog do jornalista Luis Nassif sobre o caso Renan Calheiros. Ainda tem muita pororoca pra correr debaixo dessa ponte...

De qualquer modo, registro minha absoluta concordância com a avaliação de Nassif.

Saludos,

Samuca

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Ecos do caso Renan

Luis Nassif (http://luisnassif.blig.ig.com.br/)

A “Folha” e o “Estadão” de hoje resolveram ir além dos dossiês e fazer jornalismo.

Reportagem de Ranier Bragon comprova que os R$ 100.000,00 se destinaram, mesmo, a um fundo de educação da filha de Renan Calheiros.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), encaminhou ontem à Corregedoria da Casa dois recibos de pagamento, no valor de R$ 50 mil cada um, em que constam assinaturas atribuídas à jornalista Mônica Veloso e ao advogado dela, Pedro Calmon.
A Folha apurou que os recibos, datados de 2006, especificam que os R$ 100 mil "em moeda corrente" são destinados à criação de um fundo destinado ao custeio com educação e desenvolvimento cultural da filha que Renan teve em 2004 com a jornalista.
Em recente entrevista à Folha, Pedro Calmon negou a existência de um fundo específico para educação e deu a seguinte explicação para os recibos: "Na época foram feitos dois recibos para justificar os pagamentos, e a fórmula que se encontrou foi essa. Um pai que quer criar um fundo para o filho vai a um banco e o faz. Não posso aceitar, porque essa versão atinge a minha cliente, já que esse dinheiro não existe mais, foi usado como o que é: uma complementação de pensão alimentícia. Foi usado no aluguel e em outras despesas".

Os advogados de Renan mostraram ao repórter os extratos da conta dele, com saques cujos valores superam os R$ 12 mil mensais que ele pagaria. O repórter anota que os saques não eram de valores mensais coincidentes, mas superavam esse valor. Como são saques em dinheiro, pode significar que a parcela excedente fosse para os gastos pessoais de Renan.

No “Estadão, Angélica Santa Cruz mostra a face mais óbvia e menos explorada da guerra de dossiês: seu uso indiscriminado nas brigas internas da Polícia Federal e da política.

“O Globo” continua sem explorar o seu maior furo – o diálogo do dono da Gautamo com o deputado Paulo Magalhães, que é tratado como dono da empresa (pode ser no sentido figurado, pode ser que não, mas há que se investigar). E concentra todo seu vigor no furo de terceiros. Sem a preocupação de hoje da “Folha” em levantar o outro lado, decreta em primeira página: “Caso Renan: Conselho de Ética já prepara a pizza”. E resolve dar a voz ao leitor: o trecho de um e-mail em que um leitor também decreta que “a defesa de Renan é teatral, frágil, incompleta, sem provas... e vão absolvê-lo”.

Analisem todos os comentários que vocês colocaram nas notas que escrevi sobre o tema. Eu poderia selecionar um ou todos contrários ao linchamento, para dizer que os leitores repudiam a cobertura; ou um ou todos contra o Renan, para dizer que os leitores consideram Renan culpado e a cobertura boa. Estaria refletindo adequadamente a posição de vocês? É evidente que não.

Repito: não estou absolvendo Renan de crimes que ele possa ter cometido. Não coloco a mão no fogo por ele e por grande parte dos parlamentares eleitos dentro do atual modelo político. Estou me baseando naquilo que os jornais vêm dando ininterruptamente, da sua relação com a mocinha ingênua.