Axé, Margareth e movimento negro

Do padre e sociólogo Florêncio Vaz, sobre o post Baiana quer se redimir:

Jeso, talvez o título do tópico não esteja adequado. Margarete não precisa se redimir do que aconteceu no outro Sairé, pois, pelo que eu soube, ela não fez seu show porque outras apresentações tomaram o seu tempo, e quando deram espaço a ela, já era quase a hora do vôo dela.

Eu estava lá, e ouvi quando ela disse que cantou as poucas músicas apenas em respeito ao público, ao invés de simplesmente ter ido embora. Muitos a vaiaram, como se ela fosse a responsável pelo atraso [Ou não foi isso que aconteceu?]. Vejo que ela sim foi injustiçada. Talvez outros precisassem se redimir diante dela. Mas isso não vem ao caso.

Margarete, junto com o Ylê Aiê, Olodum, Carlinhos Brown e outros artistas negros, foi responsável por um movimento fantástico que fez a Bahia e o Brasil encarar de frente e de forma positiva a sua rica tradição afro. Não devemos confundir o seu estilo como "axé". Margarete faz outra coisa.

É uma música que resgata a religião de matriz africana, como a espiritualidade dos "orixás", a história da presença dos negros no Brasil e toda musicalidade e o jeito próprio do ser negro. Quem faz axé é Claudia Leite/Babado Novo, Ivete ou Daniela Mercury, que são inclusive todas brancas. Não é coincidência que Margarete tem pouco espaço na mídia, mesmo sendo mais antiga até que essas cantoras acima. Talvez porque ela ainda é ativista social, uma porta voz do seu povo negro e de muitas das suas demandas. Não faz exatamente o estilo do artista puramente comercial.

Ainda com tudo isso, ela é uma artista "estrangeira" nestas terras. Sim, é. Talvez os negros(as) daqui pensem diferente. E não estou defendendo a sua vinda. Nada disso. Apenas quis acrescentar informações ao diálogo. Mas a pergunta colocada faz sentido: "por que cantores e bandas de fora que nada têm a ver com a cultura e a musicalidade local?" Concordo mesmo que o espaço deveria ser ocupado por artistas pelo menos da região amazônica. E temos sim muitos e bons.

Comentários

Anônimo disse…
Parabéns Florêncio! Lúcido e sensato como sempre!

Willivane
Anônimo disse…
Fico cada vez mais impressionado com essa triste insistência de se colocar a culpa do fracasso de alguém na cor da pele.
Se ela não faz "estilo puramente comercial" pra que comçou a compara-la as outras cantoras "brancas"?
Que necessidade é essa de sempre martelar e tentar massificar o fracasso profissional de alguém pela sua cor de pele? Só faltou dizer que ela foi vaiada por ser negra. A bengala da cor da pele como justificativa pra todo e qualquer fracasso só piora a situação.
Martinho da vila, Gilberto Gil, Alcione, Milton Nascimento e outros tantos gênios da música tem o espaço que quiserem na mídia porque suas músicas são boas e porisso são comerciais. Porque o padre não reclama da falta de cantores japoneses na mídia? Seria preconceito?
A estupidez dessa necessidade de auto-afirmação de raças (que não existem do ponto de vista biológico) só alimenta o preconceito e em nada favorece a melhoria sócio econômica dos afro-descendentes. Será que teremos que criar o movimento nordestino pra por a culpa na sociedade "branca" que chama de "arigó ou cabeça chata" os irmãos do nordeste? Criaremos cotas para nordestinos ou nortistas por serem historicamente menos favorecidos?
Quanto mais nos fizerem de "coitados" por sermos negros, arigós ou gaúchos, mais seremos segregados por não conseguirmos expressar nossas capacidades de forma independente.
Negro, azul, amarelo, branco ou vermelho tem que ser competente pra ser reconhecido. Quer ser respeitado, independete se é do Ceará, São Paulo ou comunidade Quilombola? Trabalhe e tenha sucesso. Movimento negro só vai servir quando deixar de pensar só em música, em "axé", futebol e todos os estereótipos que fazem com que creiam que negros só "servem" pra "entreteimento". Porque o tal "movimento" não mostra cientistas, empresários, homens públicos negros como referências? será que não há ninguém ou não interessa mostrar e comentar pois isso é "coisa de branco"? Porque não estimulam a se desenvolver como qualquer japonês, coreano, israelense ou mexicano? Trabalhando, estudando e vencendo obstáculos com competência e não com "movimento dos quadris negros" é que um dia poderemos pensar em ter respeito.


Sebastião Silva - advogado