Jornalismo e linchamentos

Samuel Lima (*)


O alerta partiu do jornalista Elio Gaspari, em coluna publicada nos jornais de 17/06/2007: "Vavá está sendo linchado". Profissional de renome nacional, reconhecido por ser crítico contumaz do governo Lula, Gaspari está longe de ser considerado um "petista", "lulista" ou "comunista" e outros "istas".

Escreve Gaspari: "Genival Inácio da Silva, o Vavá, está sendo covardemente linchado porque é irmão do presidente da República. Ele é acusado de tráfico de influência sem que até hoje tenha aparecido um só nome de servidor público junto ao qual tenha traficado qualquer pleito que envolvesse dinheiro do erário". A revista "Veja" (20/06, p. 64) acusa: "o irmão mais velho e o compadre do presidente Lula estão envolvidos até o pescoço no submundo da máfia do jogo". Mas, se contradiz em seguida: "Cabe agora à polícia apurar se Vavá conseguiu levar adiante algum dos projetos que ajudou a apresentar a órgãos públicos em Brasília" (?).

Enquanto não surgem provas, prevalece o sensacionalismo que vitamina o negócio da mídia. Gaspari interpreta de outro modo: "Antes da conclusão do inquérito policial, Vavá foi irremediavelmente satanizado a partir de indícios, suspeitas e manipulações. Seu linchamento não busca o cidadão metido com vigaristas. Busca a jugular do irmão".

O Ministério Público Federal indiciou, no dia 19/06, 39 acusados na operação Xeque-Mate. O irmão do presidente não foi denunciado porque, segundo o MP, "não há elementos suficientes nos autos que indiquem a sua participação em qualquer uma das quadrilhas denunciadas". E mais: inexistem informações suficientes sobre os possíveis beneficiários das ações do "lobista" Vavá.

Vejamos duas formas de noticiar esse último fato. No "Jornal Nacional" (19/06/2007) o título não é sobre os 39 denunciados, mas foca num procedimento usual neste tipo de caso: "Procuradores do MP pedem novas investigações sobre irmão de Lula", dando ênfase absoluta no fato de os procuradores terem solicitado "novas investigações para apurar um possível envolvimento de Vavá".

No jornal "A Notícia" (20/06/2007, p. A5), um título contrariado: "MP denúncia 39, mas livra o irmão de Lula". Se o Ministério Público "livrou" foi conivente ou cedeu à pressão de alguém. Ora, a reportagem esclarece que não há provas contra ele. Entre declarar "inocência" e dizer que "MP livra" Vavá existe um abismo amazônico...

O jornalista Luis Nassif, em sua obra "O jornalismo dos anos 90", resgata uma série de casos nos quais a mídia incorreu nos mesmos erros. Destaco: "Escola Base" (1984), o mais conhecido, em que três casais donos de uma escola de educação infantil, em São Paulo, foram linchados durante três meses pela mídia nacional acusados de abuso sexual de crianças – e eram inocentes; "Bar Bodega" (1996), quando a Justiça já condenara cinco jovens e periferia por homicídio, mas logo se descobriu que eles haviam confessado sob tortura; "Osasco Plaza Shopping", que explodiu em julho de 1999, deixando inúmeros mortos e feridos. O administrador Marcelo Zanotto, acusado de dolo eventual (intenção de explodir o shopping visando lucro), seria inocentado um ano e meio após a tragédia. Sobre este último caso, escreveu Nassif: "É imensurável a responsabilidade da mídia ao veicular bastidores das tragédias, é inadmissível dar créditos às declarações de indivíduos ávidos da fama e aos boatos mais estapafúrdios, transformando versões em fatos, sem ouvir todos os envolvidos".

Para esses casos vale o que Nilson Lage define como a "natureza axiomática" da notícia: saiu na imprensa é "verdade". O contraditório não tem o mesmo espaço da denúncia e, por mais verdadeiro que seja, soa sempre como uma "desculpa esfarrapada". Ao acusado cabe o ônus de provar sua inocência, numa inversão perversa do direito universal da presunção de inocência.

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(*) Santareno, é jornalista, coordenador do Curso de Jornalismo do Bom Jesus/IELUSC.

Comentários

Anônimo disse…
Do Site de Paulo Henrique Amorim

. O Ministério Público Federal em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, concluiu que “não há nos autos elementos que indiquem a participação (de Vavá) em qualquer uma das quadrilhas denunciadas”.
. Vavá é o novo “Escola Base” e “Celso Daniel” da imprensa brasileira.
. Ou seja: a imprensa condena um criminoso que não cometeu crime.
. O chamado “caso Celso Daniel”, que perseguiu todo o primeiro mandato do Presidente Lula, era apenas, como demonstraram duas investigações diferentes da polícia tucana de São Paulo, uma tentativa de derrubar o Presidente Lula.
. Vavá é outro criminoso sem crime.
. A mídia conservadora (e golpista) o condenou, caluniou e denegriu.
. Depois do Vavá vem o Vevé, o Vivi, o Vovó e o Vuvu.
. E assim será até o fim dos tempos.
. Assim o fará a mídia conservadora (e golpista) sempre que um Presidente for trabalhista.
. Foi o que fez com Vargas, JK (que se elegeu em aliança com Jango), Jango e Brizola, que sempre foi um alvo preferencial das Organizações (?) Globo.
Anônimo disse…
A dita grande imprensa nativa

Um estudo do Doxa, vinculado ao Iuperj, analisa o comportamento de três jornalões (Estadão, Folha e Globo) na cobertura das eleições presidenciais de 2002 e 2006. O resultado do trabalho está na CartaCapital que vai às bancas amanhã em São Paulo e no sábado no resto do País. Transcrevo a consideração geral feita na conclusão do estudo, definição lapidar, a meu ver, da dita grande imprensa nativa.
“Os grandes jornais de circulação nacional, no Brasil, adotam um híbrido entre os dois modelos de pluralismo: formalmente, no discurso ético de auto-qualificação diante dos leitores, procuram associar-se aos conceitos e rituais de objetividade do jornalismo americano, como é possível constatar nos slogans, diretrizes oficiais, manuais de redação, cursos de jornalismo. No entanto, na produção do impresso diário, o que vimos são diferenças no tratamento conferido aos candidatos, de amplificação de certos temas negativamente associados a Lula, contraposto à benevolência no tratamento de temas espinhosos relacionados a seus adversários.”
blog do mino
link do post=http://z001.ig.com.br/ig/61/51/937843/blig/blogdomino/2007_06.html#post_18881379
Anônimo disse…
É evidente que se vai dizer agora que nada houve, que se trata de perseguição contra um pobre coitado, contra o irmão do presidente, contra um representante dos pobres perseguido pelos poderosos, pela mídia...
E o que o dito cujo diz nas gravações não deve ser levado em conta, afinal, ele é bobo, movido pela ingenuidade.
E nós, cara-pálida, o povo brasileiro, somos o quê?
Jornalistas devem exigir punição para todos, pobres e ricos que cometem crimes e não apenas àqueles a quem lhes convêm.
Se a grade imprensa crucifica Vavá, os seus defensores (e do governo) também não devem apressar-se em inocentá-lo diante das evidências.
Convêniência é isso.
Anônimo disse…
Não ei escrever e não escrevo com intenção mas,com tristeza. Porra Samuca! Porra! ë inadimissível que tu se preste a isso. defender partido em vez de gante.Não ver o/ou escrever sobre os defeitos desses políticos desonestos. Pelo menos ouve a voz dos sábios ouve Saramago que disse: "Quando eramos de esquerda achavamos a dieita etúpida. Agora, não conheço nada mais estúpido do que a easquerda" Não se se as palavras são esa mesma mas, continuar defendendo partidos em plena decadência política é muita injustiça.or
Anônimo disse…
Caro Jeso,

O assunto também foi tema da última coluna dominical do jornalista Mário Magalhães, ombudsman da "Folha de S. Paulo" (edição 24/06/2007). O editor-assistente do observatório da imprensa, Luiz Antonio Magalhães (http://blogentrelinhas.blogspot.com/) assim registrou:

"Ombudsman condena linchamento de Vavá - O novo ombudsman da Folha de S. Paulo, Mário Magalhães, começou muito bem no serviço. Todo domingo tem um texto contundente apontando as bobagens que aparecem no jornal. Na última edição, dedicou a abertura da coluna ao irmão do presidente Lula que tanto sucesso andou fazendo na impressa apressadinha. Magalhães concorda com Elio Gaspari: Vavá foi linchado na imprensa. Corretamente, o ombudsman reclama porque a Folha não citou o nome do irmão de Lula na chamada de capa sobre o indiciamento dos suspeitos nas investigações da Operação Xeque-Mate. Vavá, como se sabe, não foi indiciado...".

Estou, portanto, falando em português (do Brasil), não em sânscrito nem mandarim clássico. Não de partidos, mas de gente e do interesse público - e de crítica do papel da mídia. Os casos citados por Luis Nassif não envolvem partidos nem políticos, mas cidadãos comuns linchados pela mídia.

Abraços fraternos, mano velho!

Samuca
Anônimo disse…
eu sou burra demais. Entendi o que o professor escreveu, mas não entendi o que o anônimo que chamou o professor "à vera" quis dizer: é tipo assim, o prof. não pode ter ser simpatizante de um partido político também? Ele tem sempre que acreditar no que está escrito? Se for assim, eu não queria como meu professor, porque assim, me basta pensar com minha parca cabeça.
Anônimo disse…
Tathy
Pois bem, pense por sí só. Isso não é proibido.Leia mais os grandes clássicos e construa o seu conteúdo. Acreditar no está escrito por qual lado? Leitura segmentada?Lições ao inves de leitura?Maniqueísmo....
Anônimo disse…
Meu caro Samuel,

São artigos, os quais tenho lido, são sempre muito bem produzidos. Mas, nesse você conseguiu ser muito melhor. Sua análise é corretíssima a respeito do linchamento que a imprensa promove e cada vez com mais assiduidade.

Da próxima vez que você escrever sobre o assunto, por favor inclua o caso Ibsen Pinheiro, brilhante político gaucho, na época ( na década de 90) presidente da Câmara Federal, que a Veja, irresponsável e premeditadamente acusou de ter uma pequena fortuna em sua conta, quando na verdade tinha uma merreca.

A revista sabia que a informação era mentirosa, pois o repórter ligou para a redação na noite que a edição estava sendo fechada. Mas, o editor chefe disse que a capa, que custara 120 mil dólares não podia ser jogada fora.

Desde então recusei-me a continuar sendo assinante dessa revista.

Não é só a veja que faz isso. Mas, considera que ela é a pior de todos os grandes veículos.

Grande abraço

Jota Parente