Poesia

Joguem minhas cinzas no rio Tapajós

Santarém, ontem estive contigo
E pisei a terra arenosa
Dos teus translúcidos igarapés
E caminhei nas águas
Azuis e límpidas do teu rio
De quimeras!

Sim, o incrível rio Tapajós, tributo aos índios
De mesmo nome, contemporâneos
De Pedro Teixeira.
Foi daí que entendi a razão do poeta,
Seu êxtase, sua obsessão,
Sua rendição...

Conversei longamente com teus
Filhos jovens e idosos,
Todos orgulhosos de ti.
Falaram do teu passado apoteótico
E das tuas belezas naturais
Que são tantas e intraduzíveis.

Admirei sabê-los artistas e apreciadores
Das artes.
Intuí fosse pura coincidência,
Mas, as evidências me venceram
E convencido aventuro-me a sugerir:
“Seria o azul hipnótico do teu rio
Ou a alvura celestial das tuas praias
O motivo de esfuziante inspiração?”

Quis saber o porquê da revolta
Dos teus filhos à expansão da soja
No teu solo de água e raízes
E as respostas me vieram rápidas
Como flechas e doídas como
A morte: “sangria à mata e seus mananciais;
O monopólio com suas mazelas;
O colono escorraçado de suas terras
E o poeta abatido sem versos de felicidade...”

E vi que estavam certos:
Foram-se os fósseis indígenas da Vera Paz.
Em seu lugar, aterro, galpões, concreto e ferro
E o egoísmo voraz e insaciável do capitalista
E os versos do poeta enterrados sob os
Escombros...

Percebi que muitos dos teus filhos
Já possuem consciência ecológica
E isso é um fato perceptível em todo
Este país, graças a Deus!
E assim, ainda que vagarosa e silenciosamente,
Entendem que a tua vocação é mesmo
Ser a rainha, tal como nossos pais e avós
Haviam vaticinado.
Por isto tua feição muda para melhor,
Embora os paradoxos acima relatados.

Mentes doentias, vontades pueris ou
Políticas vis arrancaram-te o mais
Valioso dos teus dotes: o Teatro Vitória!
Nefasto dia. Perda irreparável!
Chorou o poeta, chorou o artista, os teus
Jovens estudantes, todos choraram...

Ainda há tempo, Santarém, de resgatares maravilhas da
Tua história, do teu acervo cultural. Reconstrói
Das cinzas o teu bem maior e
Teus mortos dormirão em paz e
Teus filhos te serão eternamente gratos.

Santarenos, povo sábio, sensível, privilegiado
Por Deus, não deixais enlamear-vos pela ganância
Apressada dos invasores! Cresceis firmes no chão e
Mostrais ao mundo que nossos pais e avós estavam certos.
Mostrais sim, que Santarém veio dos céus
Para ser reverenciada e amada por seus filhos
E por todos que conseguem ver a importância
E o sentido da natureza para o homem.

E eu, um modesto enamorado, mas sincero,
Irredutível e fiel não canso de te decantar.
Só a morte pode abafar meu grito. E quando
Esse dia chegar, peço-te: deixa que joguem as minhas
Cinzas no leito tranqüilo do rio Tapajós!

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De Paulo Paixão.

Comentários

Anônimo disse…
Já vai alguns anos e o grande poeta Emir Bemergui profetizou que o nosso rio Tapajós poderia sofrer danos permanentes em decorrência da corrida do ouro que devastou inúmeros afluentes. Na data que o poeta fez seus comentários o rio tinha perdido sua cor e passara a ter águas turvas . Hoje leio estas palavras de Paulo Paixão e vejo o grau de inquietação com o destino que Santarém inercialmente caminha. O poeta Paulo pelo menos sonha que um dia haverá um rio que receber suas cinzas.
Anônimo disse…
Parabéns, Poeta!A revolta pela perda do Teatro Vitória ainda explode nos corações daqueles que amam Santarém.
Anônimo disse…
Quem foi mesmo que mandou destruir o teatro vitória?

Opção 1 - O pai da Maria

Opção 2 - O Pai do Everaldo

Opção 3 - Um Ex-presidente do São Raimundo

Opção 4 - Todas as opções acima estão corretas
Anônimo disse…
Quem foi mesmo que mandou destruir o teatro vitória?

Opção 1 - O pai da Maria

Opção 2 - O Pai do Everaldo

Opção 3 - Um Ex-presidente do São Raimundo

Opção 4 - Todas as opções acima estão corretas