Manhas e artimanhas de um Odisseus papachibé
Jota Ninos (*)
O lendário Odisseus, mais conhecido por Ulisses, é reconhecidamente a alma e o espírito dos povos gregos da antigüidade, e quiçá de todos os povos ocidentais.
Retratado na Odisséia de Homero (ou na panacéia hollywoodiana), ele sempre será visto como o homem que resolveu seus problemas e de seu povo com astúcia e inteligência, e que por isso mesmo despertou a ira dos deuses do Olimpo, principalmente depois de sua brilhante vitória no palco da guerra de Tróia.
De todos os ardis que utilizou para enfrentar os percalços que se sucederam, Odisseus ficou mais conhecido pelo cavalo de madeira com o qual “presenteou” os troianos, admitindo que suas muralhas eram intransponíveis. Estes, seguindo a regra milenar de que “cavalo dado não se olha os dentes”, introduziram o magnífico troféu em seus domínios e se embebedaram noite adentro.
O resultado todo mundo sabe: criou-se naquele momento a expressão “presente de grego”, para identificar a dádiva traiçoeira que destruiria a orgulhosa nação de Ilios (como Tróia era chamada, daí a obra de Homero sobre aquela guerra ser chamada de Ilíada).
A postura assumida por meu colega Juvêncio em sua última pensata (Aviso aos Navegantes) nos mostra uma guinada a bombordo (à esquerda, à oeste) em sua nau desgovernada. Para quem passou algum tempo nos instigando a enfrentá-lo no debate sobre o tão propalado separatismo e a disputa dos moradores do oeste do Pará com os de Belém, eu diria que ele não escreveu uma pensata e sim uma “sensata”...
O novo discurso de Juvêncio, se não for um Cavalo de Tróia, diverge da postura anterior que mais parecia outra das artimanhas de Odisseus. Amarrado ao barco juntamente com seus homens, o rei de Ítaca conseguiu sobreviver à passagem pelo mar das sereias, não podendo ser hipnotizado por seus cantos a se atirar ao mar.
Por mais que gritássemos, Juvêncio-Odisseus não nos escutava, ao mesmo tempo que nos fazia de tolos, como Odisseus fez ao ciclope Polifemo, furando-lhe o olho e fugindo agarrado à barriga de ovelhas, antes que este voltasse a “jantar” outros marinheiros de sua nau.
Concordo solenemente com a nova postura de Juvêncio, que abandona a retórica do escárnio, para nos mostrar que é preciso enfrentar a batalha não com o discurso único de que Belém nos deixa “a ver navios”. Não que isso não seja a mais pura verdade, mas se este for o argumento dificilmente poderemos resistir à campanha, já liderada por alguns meios de comunicação da capital, que tenta solidificar a idéia do “Pará único”.
Em matéria de discurso sentimentalista, certamente a retórica papachibé se sobrepõe à dos tapajoaras, se assim podemos nos chamar (há controvérsias, não é Edilberto?).
Defendo a bandeira do Tapajós intrinsicamente, mas tenho sempre criticado o movimento sem participação popular de cunho elitista e partidário, que nos deixou à mercê de franco-atiradores em época de eleição.
Acredito também, como tenho dito outras vezes, que faz parte de nosso destino histórico a redivisão territorial da Amazônia como forma de desenvolvimento, assim como a velha província de Santa Maria do Grão-Pará se dividiu, criando estados como o Amazonas, o Pará e o Maranhão.
Não sou nenhum estudioso dos dados estatísticos já levantados por algumas pesquisas providenciadas pelos “1.500” comitês que por aqui já se formaram. Mas creio que muitas destas informações precisam vir à tona para que todos nós possamos debater o separatismo de forma mais sólida e lógica, e não apenas sentimental.
Como grego, sou escaldado a presentes conterrâneos, principalmente vindos de qualquer belenense em se tratando de Estado do Tapajós. Mas acredito que Juvêncio-Odisseus demonstra sinceridade em sua “dimensão humana” e me tento a embarcar em sua canoa, que acredito não seja furada.
Ademais, se assim for, invocarei as forças de Netuno e manterei Juvêncio-Odisseus cada vez mais no exílio, longe de sua Belém-Ítaca, e principalmente de sua Penélope que serpenteia nua por entre a floresta de mangueiras da praça da República, seu império particular.
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* É jornalista e escrivão judicial.
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